sexta-feira, 23 de novembro de 2007

Henrique

“Depende”.
“Como assim, depende?”
“Ué, depende porque depende”.

Uma quinta-feira, as três da tarde, na Praça XV é sempre familiar. Pessoas descendo da barca, indo ao centro pelos mais diversos motivos. No meio de todos esses propósitos o meu parecia o mais simples : Flanar. O motivo pelo qual peguei a barca, as duas e meia da tarde, para atravessar a Baía de Guanabara, sempre olhando para os coletes salva-vidas pendurados no teto, foi para chegar ao pedaço de terra do outro lado e passear, procurando um assunto para escrever. Porém o assunto me achou, sem eu ter que procurar.

Quando cheguei na Praça XV me deparei com uma lanchonete. O sol, que nesta hora queimava o topo das cabeças dos atarefados, me fez parar e comprar um sorvete. E foi ali que ele me abordou. Vestia uma camisa velha, surrada, que em alguma época anunciava um político qualquer, shorts curtos e sandálias de dedo, um ou dois números maior que seus pés.

“Tia, me vê um real, pra eu comprar um negócio?”
“Que negócio?”
“Relaxa Tia, é de comer.”
“O que é?”
“Um sundi.”
“Sundi?”
“É, um sorvete desses, esse com chocolate.”
“Ah, um Sunday.”

Henrique era o nome dele. E apesar de ter apenas nove anos, seus olhos denotavam algo que me assustava. Neles faltava a inocência. Henrique não mora em lugar algum. Como eu naquele dia, ele passeia. Disse que nasceu no Jacarezinho, e que a dois anos atrás fugiu de casa.

“Cansei de apanhar. Com o tempo, enche o saco”.

Fugiu com o irmão, Wellinton, de doze anos, logo após a morte da mãe, Alessandra.

“Ela morreu de sofrer.”

Quis perguntar o que essa afirmação significava, mas Henrique me barrou, com seus grandes olhos castanhos, cheios de desconfiança.
Primeiro foi a Ipanema, onde ficava perto de uma bar, na rua Maria Quitéria, pedindo moedas e ás vezes ganhado notas. E de lá foi passeando.

“Eu não sou mendigo. Não uso drogas.”

E assim tomamos os sorvetes, enquanto a imponência da estátua de Dom João VI nos observava, sem nunca saber de quantos Henriques sua colônia é feita.

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